Situação do Espírito Santo pode influenciar segurança pública de todo o país, diz promotor

O promotor Marcelo Zenkner, que já foi secretário de transparência do governo do Espírito Santo, conversou com a Contas Abertas sobre a situação pela qual o Estado está passando nos últimos dias. Para Zenkner, o Espírito Santo ganhou uma enorme responsabilidade: a de ser exemplo para o país.

“A preocupação que temos hoje se divide em dois planos. O plano interno é resolver o problema e voltar a ter uma rotina normal no Estado. O plano externo é a repercussão desse movimento dos policiais militares em nível nacional. O Espírito Santo está com uma responsabilidade muito grande de não ceder a esta chantagem porque pode acabar influenciando o que acontece nos outros estados do Brasil. Imagina se as polícias militares de todos os Estados resolvem que podem fazer esse tipo de paralisação?”, questiona.

Zenkner destaca que, preocupado com a mesma situação, o governador do Rio de Janeiro, por exemplo, concedeu aumento de 10% para os policiais militares. No entanto, o estado está conhecidamente em uma crise, sem pagar salários. No caso do estado capixaba, a situação fiscal está controlada.

“O Espírito Santo paga salários em dia, pois está com as contas públicas organizadas. A consequência de conceder aumento para os policiais militares do Estado seria ter que aumentar salários de todo o funcionalismo estadual que se sentisse no direito de também reivindicar. Assim, nós teríamos policiais na rua, mas todo o restante dos serviços públicos poderia parar”, afirma.

Zenkner afirmou que, quando foi secretário de transparência do governo, acompanhava semanalmente a arrecadação do Estado, que não cresceu em nenhum mês em razão da grave crise que o país vivencia. De acordo com ele, cada mês que passava surgiam mais dificuldades para pagar o funcionalismo. “Não existe o dinheiro para aumentos. Os policiais querem algo que não existe”, aponta.

Outros ponto problemático destacado pelo promotor é a percepção por parte da polícia militar, com o subterfúgio dos parentes, de que pode fazer greve e colocar o governo contra a parede por melhores salários.

“A população não respeita mais a polícia Estão violando a Constituição e colocando a população como refém nas ruas em troca de dinheiro. As autoridades estão conversando com as mulheres de policiais porque eles não querem se envolver no movimento diretamente e anunciar a greve de maneira ilegal. Isso é chantagem”, destaca.

Relato

Confira o relato do promotor sobre os últimos dias no Espírito Santo:

“Tudo começou com alguma movimentação de mulheres de policiais acampando e impedindo que eles saíssem para realizar a patrulha e o trabalho de prevenção ao crime. No começo, poucos acharam que isso ganharia força. No entanto, o movimento era organizado pelos próprios policiais militares, que não podem fazer greve, conforme a Constituição, colocando os parentes como escudo. Dessa forma, os policiais estão “presos” dentro dos quartéis.

A consequência dessa paralisação pode ser vista nas ruas desde sábado. A partir do momento que começou a ser veiculado que não tinha policiamento nas ruas, começamos a conviver com todo tipo de crime. São mais de 100 mortes em seis dias e diversos estabelecimentos saqueados. Nada está funcionando, desde hospitais e escolas até tribunais e fóruns. Estamos totalmente desguarnecidos em termos de segurança pública.

As pessoas que estão fechando os portões dos quartéis são extremamente intransigentes. A pauta das reivindicações é absolutamente insana. As mulheres dos policiais querem 100% de aumento e perdão para todos os crimes que eles já cometeram. Estão violando a Constituição e colocando a população como refém nas ruas em troca de dinheiro. Isso é chantagem.

O governo estadual pediu ajuda federal. A Força Nacional está nas ruas, mas são agentes públicos que não conhecem a cidade, não há plano estratégico para a atuação de segurança pública do Exército. Assim, a onda de violência não parou, apesar dos militares nas ruas. Os bairros mais distantes e mais pobres continuam do mesmo jeito”.

 


Publicada em : 09/02/2017

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