Pacote anticorrupção extingue o financiamento de campanhas com dinheiro público e inclui o combate à corrupção nos currículos escolares

O uso de recursos públicos para financiar campanhas eleitorais é um dos alvos do pacote anticorrupção lançado em junho pela Coalizão Unidos contra a Corrupção, da qual a Contas Abertas participa. O documento, que busca o apoio de candidatos ao Congresso Nacional, prevê o fim do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, que destina R$ 1,7 bilhão aos partidos políticos no pleito de 2018, uma alternativa encontrada pelos deputados e senadores para o fim das doações de empresas.

O pacote reúne 70 medidas, é considerado o maior pacote anticorrupção do mundo, e busca combater o desvio de dinheiro público em várias frentes, desde a criação de um processo seletivo para a nomeação de cerca de 100 mil ocupantes de cargos em comissão da União até a inclusão do combate à corrupção nos currículos escolares. O pacote foi já tema de audiência pública na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados e vem sendo discutido com candidatos ao Planalto.

Uma das prioridades do pacote anticorrupção é fomentar a participação popular no processo legislativo. Uma das propostas prevê a possibilidade de projeto de iniciativa popular para emendar a Constituição ou propor mudanças em projetos de lei em tramitação no Congresso. O pacote avalia que a coleta e a conferência de assinaturas têm dificultado os projetos de iniciativa popular e, por isso, também prevê a coleta de assinaturas por meio eletrônico.

A definição de regras para combater a corrupção e promover a transparência ganharia uma instância nova de poder, o Conselho Nacional de Estado, vinculado ao Congresso Nacional, mas com autonomia para aprovar normas administrativas nacionais. A proposta é que o conselho seja integrado pelo advogado-geral da União e mais oito membros indicados pelo presidente da República, com mandato de seis anos.

Outra forte preocupação do pacote é fomentar o controle social. A primeira das 70 medidas prevê a criação de um Fundo Nacional para a Promoção da Integridade Pública, que financiaria um novo Sistema para a Promoção da Integridade Pública, destinado a ampliar o controle social. Não há previsão de gastos com o sistema, a ser financiado com recursos públicos.

Tampouco há previsão de gastos para o incentivo à delação proposto tanto no setor público como nas instituições ou empresas que recebam recursos públicos. O pagamento de “retribuição pecuniária” está previsto na proposta de criação do Programa Nacional de Incentivo e Proteção de Relatos de Suspeita de Irregularidades.

As 70 medidas do pacote estão agrupadas em 12 blocos, que reiteram algumas propostas já bastante discutidas, como criminalizar a prática do caixa dois nas campanhas eleitorais e restringir ainda mais o foro privilegiado a autoridades. E avançam em medidas como a contratação obrigatória de um seguro-garantia em todas as contratações de bens ou serviços com valor superior a R$ 10 milhões. Essa medida seria combinada à exigência de projetos executivos para contratos de grande vulto, de forma a evitar aditivos contratuais milionários flagrados pela Operação Lava-Jato.

O fim do financiamento público de campanha não é a proposta que deverá receber maior oposição dos políticos. O pacote reduz a imunidade parlamentar ao propor que de deputados e senadores tenham a prisão preventiva autorizada.

O enriquecimento ilícito de autoridades é outro alvo importante do conjunto de medidas. O pacote propõe a criação do Sistema Eletrônico de Registro de Bens e Valores para armazenar e analisar informações sobre a evolução patrimonial de agentes públicos.

Para fechar uma das brechas à corrupção, propõe-se limite de R$ 10 mil para as transações comerciais ou profissionais em dinheiro vivo.  Acima desse valor, as transações têm de ser feitas por meio de instituições financeiras. A posse de dinheiro vivo é limitada a R$ 300 mil.

O pacote alcança membros do Poder Judiciário e do Ministério Público ao propor a reforma da Lei de Abuso de Autoridade, de 1965. Mas o documento diz que as mudanças da legislação devem ser feitas com cautela para não “obstruir o exercício regular e legítimo da função pública ou permitir que sejam usadas por pessoas poderosas para ameaçar as autoridades que as investigam”.

O pacote lançado em junho se vale de uma “janela de oportunidade” enxergada pela Transparência Brasil durante o período da campanha eleitoral para aprimorar o combate à corrupção e retomar, de forma ampliada, o debate iniciado com a proposta de iniciativa popular deflagrado em 2015, em torno das “dez medidas contra a corrupção”, cujo debate no Congresso foi encerrado no final de 2016 por falta de quórum.

Uma das causas da corrupção apontadas no pacote é o excesso de burocracia no país. Para enfrentar o problema, o pacote sugere a criação de uma Política Nacional para a Desburocratização, um Sistema Nacional para a Desburocratização e um Conselho Nacional para a Desburocratização para cuidar da adoção de medidas contra o excesso de exigências burocráticas. “Afinal, o pagamento de propina tem como objetivo, com frequência, superar entraves e obstáculos burocráticos”, diz o documento.

O site onde estão detalhadas as 70 medidas contra a corrupção é: https://unidoscontraacorrupcao.org.br/

 


Publicada em : 06/09/2018

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