“Embates cívicos podem agravar ainda mais a situação no Brasil”, afirma Roberto Romano

O professor de ética e filosofia da Unicamp Roberto Romano conversou com o Contas Abertas sobre os desdobramentos da 24º etapa da operação Lava Jato. Para ele, é de se esperar que ocorram embates cívicos nos próximos dias. “Esses embates cívicos podem agravar ainda mais a situação do Brasil”, explica.

lulatrabRomano afirma que as ações vão inflar as manifestações marcadas para o próximo 13 de março. “Eu não acredito que serão vistos números de manifestantes iguais aos das jornadas de junho de 2013. No entanto, construindo uma previsão, a tentação dos lulistas é comparecer e isso pode radicalizar os movimentos. Tudo vai depender da correlação de forças”, afirma. Pela manhã, agentes da Polícia Federal cumpriram mandado de condução coercitiva contra o ex-presidente Lula em São Bernardo do Campo, em São Paulo. A ação da PF, parte da 24ª fase da Operação Lava Jato, investiga desvios de recursos de estatais, como a Petrobras, e o pagamento de propina a agentes públicos, políticos e partidos.

Depois da ação, o Partido dos Trabalhadores convocou a militância a defender, ao lado de nossos aliados, nas ruas e nas instituições, as regras constitucionais e a inocência do ex-presidente Lula. “O Partido dos Trabalhadores, nesse momento de afronta ao sistema democrático e à soberania popular, reafirma a mobilização permanente da militância”, afirmou em nota.

O próprio ex-presidente Lula já havia convocado o “exército vermelho” para as ruas, falando do Movimento dos Sem Terra. Para o Romano, o MST tem uma pauta própria.

“O movimento vai apoiar até o momento que suas pautas sejam incluídas e muitas não foram atendidas nos últimos ano. O MST teria uma ação imediata, mas não é bem assim, não é automático, a tendencia geral é tentar defender as conquista de esquerda, mas sair nas ruas é uma passo grande. A verdade é que Lula blefou”, explica. Lava Jato chega ao Lula Ações de hoje são consideradas históricas pelo professor da Unicamp. Para ele, o próprio Lula e o PT fizeram que isso fosse acelerado para hoje. “Eles se defendem das acusações como imputáveis, acima do bem e mal, como quem não tem que prestar conta para ninguém”, explica. Além disso, Romano afirma que às críticas ao juiz Sérgio Moro, aos promotores da Lava Jato e à Procuradoria-Geral da República também foram realizadas de maneira errônea. “Lula deveria ter se explicado de maneira convincente, apresentando provas. O que Lula falava parecia conto da carochinha. O certo era dar a escritura do sítio, mostrar quem pagou, etc. Isso foi aliado ao fato de ter “cutucado a onça com a vara curta” acelerou as ações de hoje”, afirma. Instituições não estão funcionando Romano disse que é preciso negar o mantra repetido erroneamente de que as instituições estão operando normalmente. “Não acredito que isso seja verdade porque para funcionarem plenamente é necessário que os titulares cumpram as tarefas com base na missão constitucional da função”, afirma. Para o professor, a presidente não governa, o Legislativo está nas barras da cadeia e há dúvidas sobre a isenção de parcelas do Judiciário, como mostrou a delação do senador Delcídio Amaral sobre a indicação do ministro Ribeiro Dantas ao Superior Tribunal de Justiça.  “Essa anormalidade está instituída desde que entramos no primeiro governo Dilma. Já havia ali desarmonia das instituições”, explica. “Essa situação vem da atual situação do país, mas ao mesmo tempo influência a crise econômica e social inédita,, o que se soma à falta de confiabilidade. Pesquisas mostram que há uma desconfiança enorme, não só nas instituições como na própria democracia, o que é extremamente problemático”, conclui. Fim do Lulismo? Roberto Romano não acredita que esse seja o fim do Lulismo no país. “O Lula adquiriu uma figura do tipo mitológico, como o Sebastianismo em Portugal, esse núcleo duro de defesa vai continuar”, afirma. Para ele, no entanto, esse discurso será enfraquecido. Romano aponta que o enfraquecimento será decorrente do fato de não ter mais os recursos dos empresários, inclusive dos que foram pegos pela Lava Jato, e apoio da propaganda, que era tocado por Duda Mendonça e João Santana. “O mito vai continuar sendo uma figura importante da vida política nacional, mas não terá a força politica e de agregação que costumava ter. Lula conseguiu superar a crise do mensalão, mas a Dilma, sem carisma e sem liderança, acostumada a obedecer um chefe, não deverá ter o mesmo destino”, ressalta.
Publicada em : 04/03/2016

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